Olhando pela janela, Alice parou de ouvir os seus companheiros e começou a pensar na sua família e nas saudades que tinha deles. Ainda tinha dificuldades em acreditar que, afinal de contas, ela era uma feiticeira, uma pessoa magica, que vivia com uma família adotada. A sua cabeça era uma confusão completa. Tinha tanta coisa para esclarecer, procurar e encontrar. Os pensamentos acerca da sua verdadeira família preenchiam cada momento que ela tinha, dando voltas e reviravoltas, sem que ela compreende-se a ligação.
-
Alice. Alice! – chamou alguém abanando o seu braço.
-
O que? - virou-se ela, bruscamente, afastando-se ligeiramente, deixando-o
espantado. - Desculpa. Eu estava perdida nos meus pensamento.
-
Toma mais atenção... – suspirou Jake, sorrindo no final. – Estávamos a falar
acerca da escola e as saídas profissionais de cada curso.
- Saídas? Curso? Vocês estão a falar de que?
Os
três olharam-na espantados, de olhos bem abertos sem acreditar no que estavam a
ouvir. A escola a qual iam era uma das mais prestigiadas e mais difíceis de
entrar. As pessoas sem talento eram expulsas logo no primeiro dia e as
recompensas pelo trabalho e o estudo eram enormes. Quanto mais alto subias,
mais respeito a pessoa recebia dos outros.
-
O que é que tu sabes sobre o mundo dos mágicos? – interrogou cautelosamente Irene,
afastando-se um milésimo da Alice.
-
Honestamente... Nada. – confessou, olhando para baixo.
Não
a agradava nada isso, mas ninguém tinha disposição nem tempo para lhe ensinar.
Sentia que devia saber alguma coisa, porem as circunstancias não ajudavam nada.
-
Onde é que viveste até agora? – brincou Jake recebendo um ponta pé da sua irmã.
– Au. Desculpa estava a brincar.
-
Vivi no meio de humanos normais. - respondeu ela, deixando os surpreendidos. -
Que pelos vistos não são meus pais verdadeiros.
-
Então quem são? - perguntou o Jake ficando cada vez mais interessado na
historia dela, o que fez com que a irmã lhe desse outro pontapé. - Au.. Isso
foi necessário? - perguntou ele, virando-se para ela, irritado.
-Empresários...
ou estavas a falar dos meus pais verdadeiros? De qualquer maneira, eu não sei
nada sobre eles. Tal como sobre a escola ou o mundo magico. Não sei nada, ninguém me disse, nem sequer a Miranda.
-
Então... Eu explico. – Jane falou pela primeira vez em horas. – Mas terás que
prestar muita atenção. -respirando fundo, Jane começou a falar. - Tal como já reparaste antes, a magia é uma
arma muito poderosa. As ilusões são apenas um dos poderes dos mágicos. A própria
natureza e os seus elementos dividem-se, proporcionando uma fonte de poder
extra. Para te explicar tudo teria que entrar muito na nossa historia, por isso
vou só falar das coisas elementares.
"O
mundo dos mágicos existe paralelamente ao mundo dos humanos, divididos por uma
fina película de magia que funciona como um espelho e escudo. Apenas pessoas
com poderes podem passar para o outro lado.
No passado, o nosso mundo era um
lugar esplêndido e fantástico. Todos viviam lá felizes, pois com a magia podiam
resolver qualquer problema. Mas um dia tudo mudou. As nossas cidades caíram, os
castelos, palácios, estátuas, templos... nada ficou, apenas uma casa entre ruínas onde se fundou a escola para onde vamos. As crianças e os adultos foram
expulsos, ficando apenas os mais poderosos e hábeis para traz. De modo a que ninguém indesejado entre, foi criada uma barreira que, apenas graças as instruções
deixadas por alguém desconhecido, foi possível abrir, permitindo assim a
entrada de habitantes para lá. Porém, já ninguém queria voltar. Tudo estava destruído, um completo desastre. As estradas estavam esburacadas, os edifícios
em ruínas. Era um mundo morto. Algumas partes foram reconstruidas, permitindo a
educação a muitos que ficaram para reconstruir tudo. Agora muitos ficam, porém
a maioria das cidades ainda estão destruídas. Repararas quando lá
chegarmos.”
Ao ouvir a Jane, Alice não deixava de se sentir um bocadinho espantada
perante tal história. Parecia tudo muito irreal. Mas, mesmo assim, não se sabe
porque, ela voltou a lembrar-se do dia em que a mãe, Lily, disse que ela
nasceu. Lembrava-se de ouvir-la dizer que chovia muito nesse dia, com enormes
trovoadas e trovões que envolviam os céus negros de Verão. Pensando nisso
naquele momento, ela entendeu que a Lily deve ter falado do dia em que a recebeu. Olhando para baixo,
uma torrente de perguntas investiram o cérebro dela, como “Será que a minha mãe
verdadeira ainda anda algures por este mundo?” ou “Terá ela desaparecido com as
nuvens?”, mas mesmo assim um pouco presente na conversa da Jane.
- Mas não tens que prestar atenção a
esses disparates. – afirmou repentinamente Jake sorrindo. – Quase já ninguém
liga ao passado, pelo que a tua falta de conhecimento histórico não vai ser
notada muito. Apenas deves fingir que não estas surpreendida por tudo o que vês, ok?
Acenou com a cabeça em concordância,
sabendo que talvez isso seria muito melhor. Porem as caras enigmáticas dos
amigos assustavam-a um pouco. Porém resolveu não lhes perguntar, entretendo-se
a olhar para o passar lento das nuvens. Repentinamente, a porta escura abriu-se
rapidamente, entrando lá dentro a rapariga de cabelos loiros longos que tinha
visto ao pé do William. Tinha uma cara arrogante ao olhar para o pequeno grupo
sentando nos sofás.
- Aonde o mundo desceu. – afirmou.
Tinha uma voz muito fina, como se
ainda fosse uma criança. As roupas que vestia eram muito finas e elegantes.
- Nunca pensei que chegaria a viajar
no mesmo dirigível que gente da vossa classe. Pelos vistos essa escola nem é
assim tão importante como dizem.
Lançando um olhar de nojo e um de ódio profundo a Alice, a rapariga loira saiu
sem sequer fechar a porta atrás de si. Irritada com a sua indelicadeza, Alice,
que naquele instante estava o mais perto da porta, levantou-se para fecha-la. Agarrando
a maçaneta, Alice olhou para cima e deu-se de caras com a pessoa que menos queria
de ver naquele momento, o William, que seguia a rapariga mal educada. Com o ódio
a subir outra vez à cabeça, e com os olhos a arder de vontade de chorar, Alice,
com um “com licença” sarcástico, fechou a porta com um grande “Bam!” mesmo na
cara dele, sentando-se logo e cruzando os braços para não matar ninguém.
Os seus companheiros, zangados por
causa da estranha, ficaram espantados por vê-la reagir daquele modo.
- O que se passa? Se foi por causa da Ellian Bordaux tens que te habituar.
Alice olhou para Irene surpreendida.
- Não me digas que estavas chateada
por outra coisa. O rapaz que passou agora irritou-te? – interrogou outra vez, extremamente perspicaz.
Um pouco surpreendida com a pontaria
que a Irene tinha ao perguntar aquilo, Alice teve de tentar
inventar qualquer coisa.
- Não, estou
zangada com a rapariga. Quem é que ela pensa que é?
- A rainha!
– disseram os três em uníssono.
A surpresa foi substituída pelo riso geral.
Pelos vistos cada um já tinha a chamado assim em privado, sendo a primeira vez
que todos concordavam nessa alcunha. Passando uns minutos, quando tudo já se
tinha calmado,a Jane recomeçou a sua explicação.
- Portanto –
disse ela para clarear a sua voz - apesar de já não vivermos no nosso mundo, muitos costumes
mantiveram-se. O nosso mundo é, ou era já não tenho a certeza, uma monarquia.
Logo, as pessoas estão divididas em classes. Primeiro vem o rei e a sua família. Depois os aristocratas, os duques e os lordes. Depois vem a baixa
nobreza e o povo. Temos outros nomes mas é para tu entenderes.
“Ellian pertence ao grupo dos
aristocratas. Estes detêm um incrível poder e sendo que o poder é transferido
por sangue, consegues imaginar como ela é poderosa, ou pelo menos vai ser.”
Jane riu-se um pouco, ficando seria outra vez dando tempo a Alice para absorver
a informação.
- William também é? – interrogou sem
pensar no que fazia.
- William? Referes-te ao William
Cold? Como é que tu o conheces? – Jake estava muito mais surpreendido do que ela
esperava.
Pelo seu tom de voz, o estatuto do
William era evidente, porem a cara dele revelava algum medo e repugnância.
Alice reprovou-se por aquele deslize tão parvo, ficando um pouco chateada
consigo mesma.
- Conheço-o só de cara. – mentiu
descaradamente – Ouvi o seu nome. Antes de entrar no dirigível. Estava com
aquela rapariga loira... Ellian, certo? Então ele também é bastante poderoso....
Jane concordou, sorrindo um pouco.
Parecia sorrir apenas para a Alice, lançando olhares malvados ao seu irmão de
vez em quando.
- A sua família é uma das mais
poderosas, podendo ser a mais poderosa a seguir a família real....
- Família real? – perguntou Alice, sentindo um pequeno aperto no coração,
apesar de não entender bem porque.
- Sim. O rei, rainha, os príncipes e princesas. Bem. Tu entendes. Mas...
Nunca mais se ouviu falar deles. Já a muito tempo que não se sabe o paradeiro
do rei e da rainha, pelo que, a irmã da rainha esta a controlar tudo por agora.
– disse ela, de má vontade como se odiasse a mulher.
- A irmã? – perguntou Alice, desta vez, um pouco mais interessada
historia.
- Sim... Ela esta na ... Ah... – exclamou ela, ao olhar pela janela. –
Vamos passar pela barreira agora.
- Pois é... – disse Irene, ao
voltar-se para Alice. - Vais adorar esta parte! – exclamou ela entusiasmada. –
Uma vez o meu pai levou a ver a casa dele e tivemos que ir pela barreira...
Adorei! Deve ser uma das coisas mais magicas que vi até agora.
“Uma das coisas mais magicas? E
então o balão? Para mim é magico o suficiente....” pensou Alice de relance.
Repentinamente, a luz desapareceu
por completo, ficando toda a gente em silencio. Assustando-se um pouco com a súbita falta de luz, Alice começou a deslizar para perto da única fonte de luz possível, a janela. Quando já estava o mais perto, pedindo desculpa por
sentar-se em cima da mão da Irene, Alice reparou que não era só o seu
compartimento que não tinha luz, era o dirigível inteiro. O pequeno dirigível
encontrava-se na escuridão total. De um lado estava um mundo verde que ela
identificou como Terra, enquanto do outro só se via uma película dourada que
lhes impedia a entrada.
- Agora vai começar. – disse Irene com
os seus olhos pretos a cintilar de emoção.
De repente, de dentro da barreira,
começaram a imergir círculos de luz, de várias cores, verdes, amarelos,
cor-de-rosa, rodeando o dirigível, e puxando-o para mais perto da barreira
dourada. Olhando a volta, Alice reparou que os círculos tinham algo escrito mas
era impossível decifrar o que estava la representado, pois os símbolos não eram
aquilo a que ela estava acostumada. Com o desejo de descobrir o que estava la
escrito ou de como tudo acontecia, Alice aproximou-se mais da janela, olhando
fixamente para os símbolos. Foi então que, quando o dirigível tocou levemente
na barreira, essa rebentou em milhares de pequenas luzinhas douradas,
contornando o dirigível elegantemente, abrindo assim, uma pequena passagem para
ele. As partículas pareciam estrelas cadentes, cintilando felizmente na escuridão total, iluminando-a pedaço por pedaço, centímetro por centímetro. As
luzes juntamente com o resto dos círculos mágicos criavam uma bela sinfonia de
cores que encantava a todos. De repente, o dirigível aumentou a velocidade
passando rapidamente pelo buraco que se tinha criado e ao qual ninguém tinha
dado atenção, abrandando logo a seguir. As nuvens carregadas de vapor de agua
impediam a vista do chão, o que fez com que todos começassem a afastar das
janelas devido ao desinteresse, voltando aos seus lugares, já com as luzes
acesas.
Ainda um pouco espanta, Alice olhou para os seus colegas que pareciam estar
a espera de alguma coisa.
- A-Adorei! – exclamou ela, sorrindo de orelha a orelha.- Tinhas razão, é incrível!
- Sabei que ias gostas. Todos
gostam. – declarou Irene, feliz por ouvir tal coisa.
Os risos encheram mais uma vez a sala e todo o dirigível, que estava
silencioso a alguns minutos devido ao espanto de alguns e aborrecimento de
outros que já tinham visto aquilo dezenas de vezes.
Enquanto iam lentamente a escola, para Alice parecia como se estivesse a
demorar toda a eternidade. A sua volta ela encontrava pessoas que sabiam pelo
menos alguma coisa sobre o lugar para onde iam e o que iam encontrar, enquanto
que ela não fazia a mínima ideia de como encarar tudo e todos. Segundo Jane,
ela não deveria preocupar-se com nada,
pois a maioria das crianças nunca foram ao mundo, apenas conhecendo-o
por alto das historias que os pais contava. Riram-se com prazer das historias estúpidas de cada um, especialmente da do Jake, que primeiro usou os seus
poderes para fazer desaparecer a sopa que detestava aos cinco anos. O mais
hilariante era o facto de ele ter acabado por come-la na mesma, forçado pelos
seus pais, da tigela do cão deles onde esta acabou por parar. Porém ninguém, especialmente Alice e
Irene, entrou em muitos pormenores acerca da sua vida, já sentindo a ansiedade
a rodeá-las vigorosamente. Só tinham a certeza de uma coisa, já estavam a
chegar.