Segundos
transformavam-se em minutos até que ela, com um suspiro ruidoso, levantou-se
apressadamente da cama e, abrindo a pequena janela, se sentou no parapeito
dessa, sentindo o vento fresco da tarde a acariciar-lhe as bochechas, enquanto
reflectia já mais uma vez naquilo que aconteceu recentemente. Honestamente,
parecia que a única coisas que fazia nos últimos dias era chorar, e tudo por
causa do William. É claro que haviam melhores dias em que ela se riu com os
seus novos amigos e descobriu coisas interessantes sobre as flores dela, mas a
sensação de estar só e triste nunca a deixava. Com um suspiro longo e profundo,
olhou para os campos a reflectir.
Era
complicado entender como é que uma rapariga como ela acabou por entrar numa
escola que parecia-se mais com um palácio ou um castelo do que uma escola
normal. Mas, havia algo que lhe atraia nesse lugar. Era lhe tão familiar e
acolhedor que ela não conseguia não sentir-se como em casa, parecendo que já cá
tinha esta no passado. Não, não era só isso. Era como se ela tivesse vivido cá,
há muito, muito tempo atrás, em que as paredes ainda não eram tão escuras e o
jardim era mais selvagem e verdejante . Suspirando perante pensamentos
estranhos e certamente errados, já que era impossível ela ter cá vivido, ela
começou em pensar na desculpa que teria de dizer a todos, visto que não seria
nada fácil explicar-lhes o que tinha acontecido entre ela e o William na sala,
sem ser necessário dizer a verdade. Ao pensar no seu nome as lágrimas voltaram,
rebeldes como anteriormente, obrigando-a a curvar-se numa bola para esconder
soluços irritantes. Ela já não entendia nada daquilo e sentia que as coisas só
ficariam cada vez mais confusas. Não entendia as acções do William, não
conseguia dormir bem uma só noite sem ter aqueles pesadelos estranhos, não
sabia o que realmente queria fazer com a sua vida. “Devia era ter ficado em
casa...” Surpreendida por ainda não ter pensado nisso, Alice saiu da posição de
bola, sentindo os raios de sol da tarde a aquecerem-lhe a cara e a secarem as
lágrimas que pararam de correr. Deliberando ainda mais um pouco em tudo, acabou
por pensar na coisa que lhe fazia mais sentido. Este não era o seu mundo, era
dos outros. Era de pessoas que entendiam tudo sobre magia e viviam nela todos
os dias. O seu tinha ficado para trás, com os seus pais e o seu irmão, e a
única coisa que lhe sobrava era voltar para onde pertencia.
-É
isso! Amanha pergunto se não posso voltar! – exclamou suspirando levemente ao
baixar a cabeça. – Mas, a resposta deve ser “Não”, não é? A Miranda de certeza que vai começar por dizer
várias coisas para me manter cá. Mas… Eu não quero estar cá…
Lamentando-se,
ficou parada durante uns segundo, até as lágrimas secarem enquanto olhava para
o quadro que aparecia se vislumbrava fora da janela. Os raios quentes e
vibrantes criavam desenhos ao embater nos vidros de azulejo da pequena capela,
todas a criarem cores diferentes, mas mesmo assim serenos e românticos, dando a
aquele pequeno relvado uma impressão de paz e sossego a quem lá estivesse. Encantada,
Alice ficou a olhar para na direcção da capela durante uns instantes até que
percebeu de que alguém a olhava. Os olhos do rapaz fixados nela pareciam
preocupados e queridos ao mesmo tempo. Surpreendida por alguém estar lá, Alice
escorregou e caiu no chão com um ligeiro bam. Levantando-se embaraçada, ela
olhou para fora da janela mais uma vez para ver quem é que era, mas já não
havia lá ninguém. Indignada e preocupada, Alice dirigiu-se até a porta para ir
lá abaixo, mas parou logo que ouviu passos do outro lado, correndo que nem
maluca para a sua cama onde se escondeu mais uma vez no meio dos cobertores,
fingindo ter adormecido. É claro que ela sabia quem ia entrar no quarto, mas na
verdade, ela não queria falar com ninguém naquele momento, nem mesmo com as suas
novas amigas.
Porém,
elas não chegaram a entrar, chamadas para as aulas pelo toque ultimo toque do
dia, deixando a rapariga ruiva sozinha em paz para organizar os seus
pensamentos confusos. O problema não era o William desta vez, mas sim os seus
novos amigos. Pela primeira vez, alguém a não ser os seus pais e irmão preocupavam-se
verdadeiramente com ela, ao ponto de a vir visitar, ou pelo menos tentar,
durante o intervalo. Eles eram diferentes do William, que só a sabia irritar, e
ela não os queria deixar. A decisão de deixar a escola parecia desvanecer-se a
medida que esse pensamento se infiltrava por entre a mente,ficando apenas uma
pequena duvida no fundo do seu coração. Não entendendo mais nada, e ficando sem
paciência para entender, Alice enterrou-se ainda mais nos cobertores.
-
Mãe... Como é que quero que estejas cá. Sempre sabes o que dizer! – sussurrou
por entre os lençóis, deixando mais algumas lágrimas escorrer, adormecendo logo
de tanto chorar.
Abrindo os olhos repentinamente,
Alice olhou a sua volta alarmada, tentando ver por entre a escuridão, com o
coração a martelar fortemente no peito e suor do medo a escorrer pelo pescoço
nervoso e exposto, incapaz de pensar com clareza. “Esta tudo bem…” sussurrou,
fechando os olhos com as palmas tremulas das mãos, tentando esquecer tudo o que
sonhou. “Foi tudo um sonho, só um sonho…” Repetia sem sezar, como um
encantamento, rezando que isso a acalma-se. Levantando-se lentamente da cama,
não conseguia parar de pensar naquele pesadelo que a assombrava já quem sabe a
quantos dias. Imagens assustadoras passavam na sua cabeça, sem parar, ignorando
a sua tentativa de as esquecer. Corredores longos, ervas velhas e secas,
caminho irregular e sujo… mas o pior era a sensação de algo a estava a
perseguir. Relembrando a figura alta no meio da escuridão que tinha visto, Alice
fechou os abriu os olhos fechados, dirigindo-se logo para a casa de banho de
modo a lavar a cara, esperando milagres da agua fria. Talvez isso a acorda-se
para a realidade. Assim que acabou, vestiu as suas roupas e saiu do quarto, esperando
não acordar as suas amigas para não lhes dar uma oportunidade de perguntar o
que quer que seja. Ainda não estava preparada para responder.
Passeando pelos corredores gigantes, Alice ainda não conseguia parar de se
maravilhar com a exuberância que aquele lugar tinha, apesar da falta de
movimento que lhe dava um ar assustador e um pouco misterioso, parecendo-se com
uma casa abandonada. Ao chegar a saída para o jardim, Alice não se conteve,
saindo para apanhar um pouco da brisa fresca e gentil da manha, que lhe
refrescava os pensamentos. Sentando-se num banco bem no coração do paraíso verde,
ela olhou a sua volta reparando que as flores eram diferentes. Estas
pareciam-se um pouco com rosa, com as suas pétalas exuberantes e encantadoras,
mas a cor nunca era a mesma, mudando de segundo em segundo seguido as cores do
arco-íris. Num momento era azul e, com um piscar de olhos inocente, já era
vermelha. “Magia…” pensou sorrindo um pouco, não tirando os olhos daquelas
flores exóticas, interrogando-se vezes e vezes sem conta porque ela estava nessa
escola. Porque ainda não tinha voltado para casa? As questões não a paravam de
avassalar até que um único pensamento se fixou. E porque não sair dessa escola?
Já que tudo estava a correr mal, não haveria problema se ela quisesse sair.
Talvez convencer a Miranda seria um problema, mas com lágrimas talvez ela
cedesse.
Tomada
a decisão, Alice rapidamente correu na direcção da sala dos professores, esperando
encontrar a Miranda lá. Ao passar pelos corredores reparou no numero de alunos
que já estavam de pé, na sua maioria com uniformes vermelhos e amarelos,
combinando em sintonia como se fizessem parte do mesmo quadro. Sorrindo sem se
controlar, Alice bateu com força contra alguém, caindo no chão rapidamente, não
batendo com a cabeça contra o chão duro por pouco.
-
Alice? – perguntou uma voz extremamente familiar.
Levantando
os olhos, Alice viu os seus novos amigos Jane, Irene e Jake, o ultimo
espalmando no chão tal como ela, que a olhavam surpreendidos e aliviados.
- Mas
para onde é que tu desapareceste esta manha? Andamos a tua procura por toda a
parte! – exclamou uma Jane muito irritada com as mãos na cintura e a expressão de
mãe zangada.
Ainda
um pouco atordoada, Alice olhava-os sem se mexer, não entendendo como é que
ela, de entre todas as pessoas na escola, acabou por chocar com eles.
-
ALICE! – gritou Jane, assustando a pobre ruiva que até deu um salto no lugar. –
Acordas ou eu vou bater-te?
-
Ah... Desculpa. – Alice riu-se um pouco abanando a cabeça, levantando-se de um
salto com a ajuda do Jake que lhe
estendeu a mão. – Eu... estive no jardim um pouco. Levantei-me cedo e não vos
querendo acordar, fui dar um volta.
- Da
próxima vez que desapareceres, deixa um bilhete, esta bem? – declarou Irene
com um sorriso simpático, ainda um pouco preocupada com o estado emocional da
nova amiga.
- Está
bem.
- Mas
o que estavas a fazer lá? Podias ter ido para o bar…
Jake
olhava-a muito preocupado, lembrando-se do estado em que esta tinha estado no
dia anterior.
- Não
havia necessidade e tenho que admitir que precisava de pensar.
- Em
que? – perguntou Jane intrigada.
- Em
muita coisa. Estava uma manha linda e as flores ainda mais. Pareciam-se muito
rosas, mas a sua cor variava demasiado.
-
Ah... Essas. – Jake suspirou irritado, olhando-a ainda mais preocupado. –
Normalmente conhecidas por "Acómito", são um pouco perigosas. Fazem com que as
pessoas tomem as decisões erradas e precipitadas. Decides algo e pode acontecer
que é a pior da tua vida. As vezes são utilizadas para torturas.
Olhando
para o jardim de longe, suspirou a entender a razão pela qual tinha tomado
aquela decisão tão precipitadamente. Afinal de contas, essa não era a solução.
- O
que eu não entendo, é como sabes tanto sobre as flores? – perguntou Irene surpreendida,
recebendo um olhar irritando da Jane.
- Oh,
não são só flores, mas também todos os tipos de ervas.., O nosso avô
deixava-lhe um montão de livros a cerca desse tema… Não consigo entender é
como ele conseguia ler isso.
- Era
interessante, ao contrario dos teus livros de história sobre magia.
- Pelo
menos esses servem para algo! – gritou Jane, pondo-se de frente ao pé do seu
irmão.
- E
esses não servem?
- NÃO!
-
Tu...
-
Parem. – gritou Alice, olhando-os severamente. – Se vocês não se apressarem, vamos
chegar atrasados.
-
Umm.. pois, desculpa. – pediu Jake, baixando a cabeça um pouco, como se fosse
um cãozinho.
- Sim.
Desculpa. – pediu a Jane também, baixando a cabeça da mesma maneira que o
irmão.
Entreolhado-se, Alice e Irene começaram a rir dos dois irmão, pois estes
eram muito mais semelhantes do que tentava parecer. Confusos, os dois irmãos
sorriram também, reiniciando a sua marcha para a sala de aula. “E pensar que eu
queria sair da escola? Essa foi a decisão mais estúpida que poderia ter tomado.
Não vou sair desta escola por nada deste mundo.” Pensou Alice, com um sorriso
na cara.
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